Um filme sobre autoconhecimento e busca da felicidade. Foram entrevistados trinta personalidades, incluindo líderes espirituais, intelectuais, artistas e esportistas.
Em toda a história da humanidade há uma questão que nos acompanha...
em qualquer momento da história humana.
A grande questão, que é absolutamente abstrata...
mas ela é funda, é...
por que existe alguma coisa e não nada?
Quatro grandes foram os caminhos para tentar responder a essa angústia.
A ciência, a arte, a filosofia e a religião.
Essas quatro áreas se dedicaram a tentar explicar...
por que nós existimos, por que as coisas existem...
com uma grande diferença: a ciência...
procurou trabalhar o "como" das coisas, isto é, o funcionamento...
enquanto a filosofia, a arte e a religião...
foram em busca dos "porquês".
Ambos são necessários.
Não ao mesmo tempo, e não do mesmo modo.
Mas tanto o "como" quanto o "por que" são necessários.
Pergunta fundamental: Deus existe, o que é, onde está?
O que estamos fazendo aqui? Para que serve a vida? Quem sou eu?
Por que nascemos, morremos, há significado nisto?
Pra que tudo isto? É por nada?
Quem sou eu? O que sou eu?
Mais do que quem...
porque às vezes nós podemos dar nossa carteirinha de identidade, né?
Tem meu nome, minha filiação...
mas não é essa a pergunta.
A pergunta é: o que é você, ser humano?
Como funciona um ser humano?
Corpo, mente, espírito.
Há separação?
Há divisão?
Tem alguma coisa fluindo, flutuando separada?
Ou será que não é uma integração, uma integridade?
Eu estou muito interessado hoje em dia na questão do conhecimento...
o quanto a gente pode conhecer sobre o mundo.
Então, uma maneira de você representar isso...
metaforicamente, é você pensar que...
tudo que a gente conhece está numa ilha.
E essa ilha é cercada pelo desconhecido.
E à medida que o conhecimento vai avançando...
a gente vai desenvolvendo novos instrumentos, novas teorias...
essa ilha vai crescendo...
mas à medida que ela cresce...
cresce também a margem...
que ela faz, a fronteira, vamos dizer assim...
que ela faz com o desconhecido.
Ou seja, quanto mais a gente conhece sobre as coisas...
mais a gente desconhece também, mais perguntas surgem.
E essa questão está ligada profundamente com a questão...
de quanto a gente pode conhecer do mundo.
Porque o ponto é que esse...
oceano do desconhecido, vamos dizer assim...
em princípio, é infinito.
Ou seja, mesmo que o conhecimento humano aumente com o tempo...
a gente nunca vai poder conhecer tudo sobre o mundo.
Então a gente tem que viver com essa sabedoria...
que a gente nunca vai poder ter uma visão completa do mundo...
o que não nos torna menos humanos.
Na verdade, nos torna mais humanos, e menos deuses.
Um terapeuta...
que faça um bom trabalho...
com seu paciente...
inevitavelmente, o paciente vai começar...
a querer ir além...
do fenômeno material.
À medida que ele se ajusta...
profissionalmente, afetivamente...
À medida que ele se alinha...
no social...
ele começa a questionar.
Quem sou eu?
O que estou fazendo aqui?
Para onde eu vou?
Será que de fato o meu propósito externo...
está em sintonia com o meu propósito interno?
Essa é a grande pergunta.
E quando a gente vai camada por camada...
sempre tem uma nova surpresa.
E mesmo que a gente chegue na luz...
depois se pergunta como a perdeu de novo.
Porque essa inspiração do ser...
ela pode escorregar de novo entre os dedos.
Ninguém deve pensar que já chegou lá.
E dizem que há um estágio que é irreversível.
Eu, sinceramente, não o alcancei.
E quando outro dia, numa palestra vieram me dizer...
que eu isso e aquilo...
eu digo: "Olha, essa não é a opinião que a minha esposa tem de mim."
"Quisera que ela tivesse toda a admiração que a senhora está tendo."
Na minha vida, o meu esporte serve como uma...
ferramenta de autoconhecimento muito grande...
primeiro, porque...
pra ser profissional e ter um bom rendimento...
você precisa se conhecer fisicamente e mentalmente.
E segundo...
pela geografia do meu esporte.
Ele tem uma relação muito direta com a natureza...
o que é saudável...
e também pela necessidade de viajar.
O que faz com que você saia...
do seu casulo e comece a entender o mundo...
e ver o mundo de formas diferentes.
A prática...
da onda gigante tem a ver com a maneira que eu vejo a vida.
Eu gosto de desafios, está entendendo?
Você se expõe de uma maneira louca, você morre.
De uma maneira preparada, você aprende.
Eu levei toda a minha vida pra me entender.
E ainda vou passar o resto dela...
procurando mais e mais...
dicas pra que eu chegue...
em algum lugar que eu ainda não estou hoje.
A busca nunca pára, a busca é infinita.
É comum a todas as pessoas buscar uma satisfação...
mas ao mesmo tempo também é comum descobrir...
que nada me traz uma satisfação de uma forma definitiva.
Nada realmente me preenche.
Então, tudo é insuficiente.
Existe uma busca...
do que é que vai dar essa suficiência?
O que vai me produzir uma satisfação de uma forma definitiva?
Essa também é uma busca comum...
mas é necessário discernir esse problema...
discernir a situação, analisar e descobrir...
do que estou sofrendo?
Eu estou sofrendo porque não tenho determinadas coisas que as pessoas têm?
Ou mesmo que eu tivesse, eu continuaria meu sofrimento?
Discernir o problema...
pra buscar a solução é fundamental.
Nem sempre a gente discerne o problema.
Mas busca uma solução.
E não sabe pra que está... a solução pra quê?
Você não sabe o problema! Então, a solução...
você não sabe nem exatamente onde que você vai encontrar essa solução.
Se nós pensarmos na criação do universo...
há 15 bilhões de anos atrás...
15 bilhões de anos e um segundo atrás...
não existia nada de acordo com...
a teoria científica mais aceita da criação do universo hoje em dia.
Há 15 bilhões de anos surgiu o Big Bang.
Houve a grande explosão.
Então, se nós pensarmos essa grande explosão...
como uma metáfora de ondas concêntricas...
quando você joga uma pedra num lago de águas tranquilas...
o que acontece? Você forma ondas concêntricas.
Então, pensemos nessa grande cadeia do ser...
como sendo essas ondas concêntricas...
que é o próprio processo evolutivo se desenvolvendo.
A primeira onda que se formou é a onda da matéria.
A primeira coisa que surgiu após o Big Bang foi matéria.
A matéria surgiu...
sob a forma de energia, matéria, partículas subatômicas...
formando átomos, átomos, moléculas, galáxias...
sóis, etc. e tal.
Posteriormente, há 5 bilhões de anos atrás, surgiu a Terra.
A Terra, matéria ainda, nessa primeira onda.
Há 3,5 bilhões de anos atrás...
surgiu a segunda onda, a segunda macro-onda.
Surgiu a vida na Terra. E essa vida, então...
partiu de todo um processo de organismos unicelulares...
por uma cadeia filogenética vegetal e animal...
até os animais superiores, até os mamíferos superiores...
e aí, há cerca de 1 milhão de anos atrás...
não é mais bilhão, é milhão...
apareceu a terceira onda...
que nós chamamos "a onda da mente". Então, veja...
esse processo de expansão de níveis de consciência...
vem se dando.
A ciência tradicional, atual, pára aqui, ela não vai além.
Mas você há de convir comigo que nós devemos...
esse processo... ele deve continuar.
Então existe um quarto nível, que seria o nível do espírito...
que seria o nível de transcendência desse nosso nível atual...
desse macronível atual, que é o nível do ego...
em que nos vemos como uma individualidade.
Nós seremos... muito mais.
Nós seremos a nossa individualidade e algo mais.
Então, esse é o conceito do Grande Ninho do Ser.
É um conceito que existe desde as tradições de sabedoria antigas...
e que hoje pode ser feita uma releitura dele...
através desse processo de conhecimento que a evolução nos trouxe.
Uma vez um aluno me pediu uma entrevista...
chegou na minha casa e me fez essa pergunta...
"Como é que o senhor se preparou?
Como é que planejou a sua vida...
pra chegar onde chegou?"
Eu percebi logo que ele me admirava...
queria seguir o meu caminho, queria...
o mapa do caminho, e eu disse a ele...
"Eu cheguei aonde cheguei...
porque tudo que planejei deu errado."
É a pura verdade!
Então eu sou...
escritor por acidente. Já fui outras coisas...
já fui professor de filosofia, já fui teólogo, já fui pastor...
agora...
sou um velho.
O ser humano não é o corpo.
Ele possui o corpo, manobra com o corpo, cuida do corpo...
mas ele não é o corpo.
Então, o Yoga...
é um estilo de vida sim, você falou bem.
É um estilo de vida...
que cultiva o corpo, mas que cultiva também a mente...
trabalha com as energias...
Os grandes iogues não trabalharam o corpo.
Você viu alguma fotografia...
do grande iogue Jesus Cristo...
de cabeça para baixo?
Ninguém viu.
Ninguém viu os asanas...
da devota Santa Terezinha.
São realidades.
Você não deixa de praticar Yoga...
quando já não tem o corpo.
Envelhecido...
89 anos.
Eu continuo praticando Yoga...
mas sem trabalhar o corpo.
É muito pobre a concepção do Yoga...
como ginástica física.
Tem um ditado superpessoal, né?
Isso já é muito íntimo, mas é um ditado que fala assim...
está comigo há muito tempo, que é...
"Tudo um dia será nada.
E esse nada será o tudo...
que tanto procuramos encontrar."
Eu não sei de onde veio isso, mas está na minha vida...
há muitas décadas.
Estou tentando entender até hoje esse ditado.
Mas está comigo... É uma coisa que veio.
A gente está falando tanto de saúde, de autocuidado...
e isso é sair de um processo de passividade...
de chegar pro médico e falar...
"Me dá os medicamentos. Me dá as vitaminas.
Me indica qual é o terapeuta maravilhoso...
que vai me tocar e vai mudar a minha vida."
Para um processo mais ligado a um autocuidado...
a um cuidado diário, com o que você come...
com a maneira que você respira, e se expressa.
Um olhar com muito mais consciência sobre os teus atos.
Isso não é muito simples...
porque o paciente vem ao médico pedindo...
o que é tradicional.
"Me tira desse lugar agora!
Eu quero uma mudança imediata."
E você devolve para ele um caminho.
Uma visão de caminhar. "Eu vou te ajudar nesse caminhar."
Mas não é uma...
uma mudança que vai acontecer de maneira tão abrupta.
Eu acho que o sentido da vida é a expressão da sua integralidade.
Quem sou eu? Onde está minha expressão aqui?
E tentar viver isso...
seja lá do tamanho que for.
Eu acho que...
tem essa reflexão...
de chegar num momento em que o ser...
é mais importante do que o fazer apenas.
Que o fazer te ajuda a sustentar o ser...
mas o ser é a base do processo.
Eu acho que isso é uma busca de autotransformação, de autoconhecimento.
A gente aprende que estamos aqui na Terra...
com uma finalidade específica...
que envolveria a nossa evolução. Se alguém me perguntar...
"O que você está fazendo na Terra?"
A gente aprende que estamos aqui para evoluir...
superando as nossas limitações...
as nossas dificuldades de problemas, de relacionamento.
Enfim, crescer espiritual, moral, intelectualmente.
Então, eu diria que a finalidade da vida...
o objetivo da vida, o sentido da vida pra mim seria isso.
O empenho de evoluir sempre.
Gente, eu sou muito tímida; eu estou fazendo um esforço.
Não, eu quero comer minha barrinha. Mas, vamos lá, pau na máquina!
Eu vou tomar água.
Vou pegar uma barrinha.
O pessoal do Big Brother anda com esse negócio aqui grudado.
Como eles tomam banho com isso?
O sentido da vida varia de acordo com a época da vida.
O sentido da vida pra mim já foi...
lutar por uma causa, depois foi amar um homem...
depois foi...
cuidar das filhas.
Às vezes, tudo isso junto, às vezes...
algo em primeira instância.
Mas, hoje em dia...
o sentido da vida é...
A vida já é, ela já tem um sentido.
Eu não sei... É diferente pra mim hoje.
Hoje eu acho que...
viver é o sentido.
Eu vi uma frase de um pensador francês aqui...
entrevistado por algum veículo...
algum jornal brasileiro, que dizia o seguinte...
"A vida não tem sentido nenhum...
mas não é proibido dar-lhe algum."
Então, esse eu acho que é um pensamento muito...
ao mesmo tempo, libertário...
e ao mesmo tempo que dá seriedade à ideia da vida.
A vida é um projeto individual...
e nisso talvez eu seja mais anarquista do que...
um indivíduo vinculado a qualquer outra doutrina...
é um projeto individual...
em que você tenta construir uma história pra você.
E uma história...
que na minha cabeça é norteada...
por valores da ordem moral...
eu sou muito zeloso desse aspecto...
vamos dizer assim, da condição humana...
e acho que tem que ter...
alguma ideia também de crescimento pessoal.
O sentido da vida é a gente sair daqui 80 anos depois da chegada...
um pouquinho melhor do que entrou.
Essa é o K2, a segunda maior montanha do mundo, mas é...
a montanha mais difícil de todas, a gente considera...
Só que aqui só está a parte superior do K2.
Ele tem 8611 metros de altitude.
Esses são os 600 metros finais.
É gigantesca a montanha; ela é muito mais imponente...
e muito mais difícil do que o próprio Everest.
Em razão de muitas tragédias que acontecem no K2...
o K2 é considerado a "Montanha da Morte".
Em termos de número de êxitos e mortes...
é a montanha em que há o maior índice de fatalidades.
Então, é uma montanha muito difícil, perigosa, muito arriscada.
Foram três tentativas e só na terceira que eu consegui chegar lá em cima.
E eu prometi nunca mais voltar ao K2.
É uma montanha muito bonita...
é uma montanha que merece muito respeito.
Mas é uma montanha muito difícil.
E não foi possível.
Não foi falta de técnica...
não foi falta de condição nossa.
Realmente nesse ano as condições do K2 estão extremas...
estão muito difíceis.
Nós conseguimos chegar...
até 8000 metros de altitude...
enfrentamos muita neve.
Infelizmente, tivemos que desistir dessa escalada.
A montanha.
Eu precisei ir até a montanha para poder me encontrar...
para poder me ver diante de um espelho.
Você estar na montanha, desempenhando...
um esforço físico intenso, muitas vezes correndo riscos...
gera-se uma grande introspecção.
Você começa a pensar em tudo na sua vida...
naquele momento em que você está ali.
É incrível como a minha cabeça viaja...
nesses momentos em que estou na montanha.
E aí você começa a se conhecer...
começa a resolver problemas dentro de você...
e ter forças pra encarar o mundo, encarar pessoas, encarar situações.
Então, isso causa uma evolução. Eu percebo que eu melhoro...
a partir do momento que vou para a montanha, e volto para a cidade.
Já chegou gente aqui... "Mas cadê os teus troféus?"
Eu não ganho um troféu...
uma medalha por ter chegado no alto de uma montanha. Acho que...
uma das maiores recompensas é aquela vista maravilhosa...
porque aquela vista me traz um momento de contemplação.
É naquele momento que eu me encontro.
Naquele momento que eu faço minha comunhão com Deus.
Um dos desafios do ser humano...
é conhecer-se a si mesmo.
Já Santo Agostinho coloca como...
preocupação básica de toda a atividade dele...
é responder: "Quem sou eu, finalmente?"
O ser humano se faz ele mesmo a pergunta.
E creio que é uma pergunta, no fundo, irrespondível.
Porque o ser humano é um projeto infinito.
Ele é um nó de relações voltado em todas as direções.
Para dentro de si, para o outro...
para a natureza, para o universo...
para o absolutamente transcendente que é Deus.
E ele se realiza na medida em que ele ativa essas relações.
Por isso, quanto mais ele...
ele se relaciona, mais ele se enriquece...
e mais descobre possibilidades...
dentro dele.
Então, ele não é um sistema fechado...
é um sistema aberto.
Daí que toda pergunta...
exige uma resposta.
E essa resposta levanta uma nova pergunta.
E assim nós vamos de perguntas em perguntas...
de respostas em respostas...
e no fundo nós não sabemos quem somos.
Então, nós sempre estamos buscando.
Encontramos espelhos de nós mesmos em todas as partes...
e não nos identificamos com nenhum deles.
Como os orientais expressam...
a prisão é Maia, a ilusão.
É eu não saber quem sou, de onde venho, pra onde vou.
E como dizem os bons navegantes...
"Nenhum vento é favorável...
para aquele que não sabe onde quer chegar."
E a liberdade...
é precisamente a pessoa tomar consciência.
E ser capaz de...
de ser o autor da sua própria existência.
Assumir a autoria da própria existência.
Não é uma tarefa fácil...
mas creio que é a nossa tarefa.
E é isso que vai nos trazer a felicidade.
E nesse momento, eu me sinto feliz.
A minha matriz criativa...
o meu modelo de universo...
a minha compreensão do mundo...
surgiu andando.
Andando, andando...
pelo agreste do cerrado...
pelas caatingas, pelas florestas.
Ali eu estabeleci o meu percurso na Terra...
que é básico. É espalhar belezas.
Fazer refletir.
Provocar.
Está aí.
O resumo do meu trabalho basicamente é isso.
O revelador acontece num momento...
muito fugaz.
Essa eu acho que é a experimentação...
esse eu acho que é o encontro com Deus, com a beleza.
É uma lembrança...
que não importa se tem registro.
Não importa a fotografia.
É algo absolutamente pessoal.
Tem que quebrar essa coisa de que você fotografa para os outros.
Não, você fotografa pra si.
Depois, você espalha. Entendeu?
É sempre difícil a gente falar das qualidades da gente, né?
Principalmente porque...
geralmente quando você fala de você...
aquilo não é exatamente você.
Aquilo é o que você quer que as pessoas achem que é você.
E é uma armadilha.
Porque você...
descobre a qualidade de uma pessoa...
não é quando ela fala de si.
É quando ela fala dos outros.
Não é?
Mas eu sei que você quer algo mais objetivo, você...
pode estar pensando: "Ela está fugindo...
da pergunta."
Mas...
acho que uma qualidade...
que a gente deve cultivar...
não é que eu a tenha...
mas que eu almejo tê-la...
é saber-me frágil.
Saber-me incompleta.
Saber-me faltosa.
Dependente...
desse outro que me sustenta, que me completa...
que me acalma, e que me inquieta.
Eu moro no sertão de Pernambuco...
numa comunidade rural que se chama Jatiúca...
que é um distrito de Santa Cruz da Baixa Verde.
Na minha experiência foi isso, né?
As mulheres silenciadas...
pelos pais, pelos maridos, pelos irmãos...
sem poder falar.
Eu tive que, com elas, junto com elas...
recuperar a autoestima.
E o que é a importância da autoestima...
na vida de uma pessoa, na vida de uma mulher...
de uma mulher rural?
Para mim, quando eu me quero bem...
quando eu me respeito...
quando eu sei que sou um ser importante...
eu não permito que ninguém me desrespeite...
que ninguém me bata, que ninguém me desvalorize.
Pra chegar até as trabalhadoras...
nós temos vários exercícios.
E nos exercícios de corpo, quando a gente perguntava...
"De quem é o seu corpo?"
Elas diziam sempre: "É do meu marido, dos meus filhos."
O corpo nunca era delas.
Aí dava...
chance, oportunidade pra gente começar a trabalhar...
"O meu corpo é meu.
Nem da igreja, nem do Estado, nem dos homens.
Meu corpo é meu."
Bom, vamos se cumprimentar novamente...
sabendo da importância dos nossos corpos...
que é com eles que a gente vive, que a gente anda, que a gente se cumprimenta.
A gente sempre muda de par.
Vamos se cumprimentar com os pés!
Nossos pés lindos e maravilhosos que nos conduzem!
Que nos levam pra roça, que com eles nós caminhamos...
nossos lindos pés!
Eu estava numa reunião...
e tinha uma senhora. Devia ter 60 anos ou mais.
E ela chorava, chorava, chorava.
Aí eu não quis expor...
e perguntar: "Por que você está chorando?", no meio de todo mundo.
Procurei uma horinha reservada, de lanche...
e aí perguntei a ela: "Por que você está chorando?"
Ela disse: "Oh, Vanete...
é porque você está dizendo tanta coisa linda...
tanta coisa importante...
e eu não vou mais conseguir mudar minha vida.
É por isso que eu estou chorando.
Eu sempre vivi com um marido que é machista...
que acha que só ele sabe.
Como é que vou mudar isso, depois que eu tenho filhos e netos?"
Aí eu disse: "Não, não chore, não. Você pode, sim."
"Mas posso o quê?"
"Você pode contar sua experiência.
Você pode dizer às outras...
às jovens, às suas netas...
que não é bom assim.
Que elas podem mudar agora a vida delas.
Você quer uma contribuição maior?"
Ela ficou com uma cara linda!
Quando alguém me pergunta: "Você mudaria algo em você?"
Eu digo: "Sempre, claro, com alegria."
Inclusive porque se há algo que me chateia, é quando alguém diz...
depois de me encontrar, depois de um ano...
"Cortella, você continua o mesmo."
Você já imaginou? Num mundo de mudança...
de alteração, de processo, eu ter ficado congelado?
Se tem uma coisa que eu detesto, é a ideia de ter uma "vida formol"...
em que eu congelo alguns cadáveres. Eu, pra usar uma frase antiga...
não me envergonho dos homens que eu fui.
Mas gosto de lembrar que eu já tive muitas vidas...
que foram sendo feitas, refeitas e reinventadas.
Ao contrário do que muita gente imagina...
a gente não nasce pronto e vai se gastando.
A gente nasce não pronto e vai se fazendo.
Eu não nasci pronto em 1954 e vim me gastando até hoje.
Eu nasci não pronto e vim me fazendo.
O que nasce pronto é fogão, sapato, geladeira.
Esse, sim, vai envelhecendo.
Então, eu quero, sim, mudar várias coisas.
Quero mudar o meu senso estético.
Quero ter uma ampliação da minha capacidade de ouvir...
de enxergar, de fruir sabores.
Quero ser capaz de mudar a minha conduta...
em relação a algumas pessoas com as quais eu convivo...
pra que ela fique melhor. Ainda bem!
Você ser do mesmo modo...
de uma maneira persistente, não é sinal de coerência.
É sinal de tacanhice mental.
Eu trabalho com cinema, ou seja, eu trabalho com a mentira...
e ao mesmo tempo, com a pura verdade.
E quando eu tinha 18 anos...
eu participei do núcleo de CPT do Antunes Filho...
o Centro de Pesquisa Teatral...
e eu lembro que lá, tinha que...
cada um recitar...
uma pequena frase pra fazer vários exercícios de teatro.
E uma frase que eu gostava de recitar, um poeminha...
que é do Fernando Pessoa, que é:
"O poeta é um fingidor. Ele finge tão completamente...
que chega a fingir que é dor a dor que deveras sente."
E...
isso o tempo inteiro, assim, acho que porque eu trabalho...
com o reinventar o mundo...
mesmo num documentário você também está reinventando...
você está colocando a sua visão...
escolhendo quais são os trechos que vão ficar...
o que não vai ficar, o que você esquece.
Então, isso é um tema que o tempo inteiro volta.
Eu lembro que eu tive uma crise...
quando eu tava filmando o "Chega de Saudade".
Na primeira semana, e é normal...
na primeira semana, você ainda... "Que filme é esse?"
Você está descobrindo a linguagem...
descobrindo os atores, descobrindo a equipe...
a engrenagem ainda não está funcionando.
E eu lembro de manhã cedinho, 5h30...
tendo que ir pro set de filmagem, e eu no hall...
de casa, no elevador, eu empaquei. Não conseguia sair...
e tive essa...
essa crise existencial que era...
"Por que eu escolhi uma profissão...
que eu fico reinventando a vida?"
"Quem sou eu pra dizer o que é a vida?"
Uma profissão maluca...
e não vejo sentido nisso.
Acho que é mais importante eu viver a vida, de verdade...
eu mesma viver as experiências...
do que eu ficar dizendo como tem que ser.
E aí o Luis, meu marido e roteirista...
quando ele percebeu que eu ia engatar nisso, ele falou:
"Está bom, OK. Tem uma van te esperando lá embaixo.
Depois a gente continua a conversa."
E ele cortou porque, naquele momento realmente...
era um questionamento profundo, mesmo...
do porquê tanto investimento para reinventar a verdade.
Em toda obra de arte há um elemento de dor.
A gente produz a beleza para lutar contra a tragédia.
Aliás, essa é uma observação que Nietzsche faz no livro dele...
As Origens da Tragédia Grega...
a Partir do Espírito da Música.
Os gregos...
tinham um agudo senso do trágico.
Eles não eram como os cristãos. Os cristãos sempre têm um final feliz...
porque ainda que tudo aconteça de desgraça...
você vai para o céu, e tudo vai ser feliz. Os gregos, não!
Tragédia era tragédia.
Ele então faz a pergunta...
Se eles eram assim tão dominados pelo...
espírito do trágico, por que eles não se matavam?
A resposta que ele sugere...
é eles não se matavam...
porque eles cultivavam a beleza.
A beleza permitia...
que eles olhassem para a tragédia face à face.
Eu sou autodidata.
Aprendi sozinha a pintar.
No meu caminhar, eu sempre tenho em vista...
a evolução do meu espírito. Eu, como espírito.
Não eu como a Tatiana hoje.
Sim, eu sou a Tatiana, também.
Então...
esse é meu caminhar. E junto com a minha arte...
a minha arte me ajuda muito com tudo isso...
porque...
é um autoconhecimento contínuo.
Estou o tempo todo lidando comigo mesma...
com coisas de dentro, então...
isso ajuda muito.
Eu nunca passo impune por um trabalho.
A gente vira um canal.
E recebe uma coisa que é... da humanidade.
Que é da existência da vida.
Você vai receber...
a força de um vulcão muitas vezes dentro de você.
Vai deixar que passe.
A experiência que eu tenho quando eu trabalho é...
a minha preparação também...
é sempre de um esvaziamento no começo...
abrir espaço...
e o quanto eu dou conta...
tecnicamente, é deixar que isso venha e me utilize.
Em alguns trabalhos, eu sou mais feliz nesse exercício.
Em alguns trabalhos, onde há mais tempo, onde há...
sei lá, um ritual mais...
mais cuidadoso, você consegue estar...
você se esvazia plenamente, a coisa passa por você, e você...
realmente se surpreende o tempo inteiro com o que está vindo.
E isso é muito... eu acho...
é onde o teu ego não vai interferir.
E é muito legal, sinceramente.
Por mais louca que seja a energia que for passar por você.
É muito interessante. É você abrir o teu inconsciente.
Aquilo que você experimenta no sonho, você experimenta na vida.
Você experimenta na arte, experimenta na atuação.
Essa liberdade, essa não repressão que existe no sonho, sabe?
O palco te permite isso. Coisas que às vezes no cotidiano...
você indo no mercado, ou conversando com pessoas...
isso é mais difícil.
Tanto o processo do ator, quanto o processo do palhaço...
são processos profundos de autoconhecimento.
Se você quiser vê-los assim.
Você tem que visitar...
profundamente...
o teu amor se você quiser fazer Romeu.
Se você não lida bem com o amor, meu irmão...
você não vai fazer Romeu.
Você não vai conseguir comunicar.
Você não consegue comunicar o teu amor pra tua mulher!
O circo é um espetáculo que desafia a lei da gravidade.
As pessoas voam, se equilibram num fio...
jogam sete... objetos para o ar.
Fazem desaparecer e aparecer coisas.
Corpos perfeitos.
Por que o palhaço está ali? O palhaço é aquele que cai!
O palhaço é aquele que erra.
O palhaço está no espetáculo de circo para dizer: "Olha, tu é humano, tá?"
"Tem lei da gravidade, tá?"
O que faz o palhaço derrubar tudo?
O que faz ele bater a cabeça na parede? O que faz ele cair no buraco?
Porque... ser quem você é...
então, eu sou aquilo lá.
E ser o que os outros querem que eu seja.
Aí eu estou indo para lá... porque eles querem...
aí eu derrubo o microfone.
Isso é o palhaço.
Isso é a técnica da palhaçaria.
Então, não, eu vou para lá porque lá está meu sonho...
mas ali a coisa me chamou, aí eu derrubo a moça...
eu derrubo o garçom.
O erro.
O erro é a nobre arte do palhaço.
A imperfeição.
A aceitação da sua inadequação.
Eu sou inadequado, e agora?
Vai deprimir...
por causa disso, ou vai rir?
É uma frase que eu li há algum tempo, que diz que às vezes...
a gente está condenado a ser feliz.
Eu gosto bastante dessa frase...
acho que ela explica muita coisa.
Quando, por exemplo...
Eu não comecei a tocar piano cedo.
E eu decidi que eu queria tocar piano...
um pouco mais tarde...
com 18 anos...
que eu realmente queria ser pianista.
quando eu percebi isso...
eu não tinha outra escolha senão ser pianista.
E, nesse sentido, senti que era quase uma condenação.
Porque pra mim ainda era uma pergunta...
"Será que eu vou realmente tocar piano? Saber tocar piano?"
E eu percebi que se não tocasse, eu me sentiria muito triste.
Então, pouco a pouco eu fui percebendo que era isso.
Quero dizer...
que às vezes a própria vida...
te apresenta o desafio...
e você não tem escolha se não encarar aquele desafio.
Então é por isso.
Se a felicidade tivesse um som, seria o silêncio.
Mas, também...
eu acho que a música de Bach...
trechos da Nona Sinfonia...
trechos de um Octeto de Cordas do Mendelssohn...
trechos de manifestações populares...
de diferentes lugares do mundo.
Uma criança que nasce, né?
São várias coisas.
Felicidade para mim se resume à paz de espírito.
Se você conseguir ter uma paz interior, você é feliz.
Enquanto nós não temos essa paz interior...
nós não somos felizes.
A felicidade é você se sentir bem com você...
e com as pessoas que estão ao seu redor.
Simplesmente é isso, pra mim.
E estar num lugar que você gosta. Eu gosto de estar...
pra me sentir feliz, eu tenho que estar...
no meio do mato, tenho que estar no meio da natureza.
Muitas vezes, a felicidade...
ela é uma sensação de estar no lugar certo, na hora certa.
Esteja acontecendo o que está acontecendo.
Ela é mais isso.
É essa possibilidade de ser.
Sem tentar manipular a vida.
Sem tentar ir para ação...
ir para o fazer...
o tempo inteiro.
Estar livre de um desejo de chegar a alguma coisa.
Então, relaxar essa busca...
básica de que falta alguma coisa.
E nem eu sei o que é...
ou então eu sei o que é, mas não consigo chegar.
A minha felicidade depende também da felicidade de muita gente.
Depende da felicidade do meu marido...
da minha família, dos meus amigos.
Eu acho que é muito difícil você ser feliz sem...
comida, sem um abrigo...
doente, sem ajuda...
eu acho... bem difícil.
Eu acho que um mínimo tem que ter.
Porque a felicidade é original pra cada um...
porque nós somos originais.
Nós somos únicos...
ainda que iguais.
E acho que a beleza...
da condição humana...
é essa possibilidade de você ser...
completamente original e completamente igual.
É um paradoxo.
E é por isso que cada um vai dar uma resposta...
diferente sobre felicidade.
A vida...
através da natureza, manifesta o tempo todo felicidade.
Você vai perceber que as pessoas sempre estão mais felizes...
quando buscam o sol...
a praia, as águas da cachoeira...
quando buscam se reunir em volta de um fogo numa lua cheia.
Pulsa...
uma determinada energia, uma determinada alegria.
A felicidade não exige dinheiro.
A felicidade não exige status...
para se manifestar.
A felicidade não exige oferendas.
A felicidade não exige um curso de MBA.
E ela não exige nenhuma formação.
Só sintonia.
Por isso, a minha resposta é óbvia.
Felicidade é um estado de espírito.
A felicidade eu acho que ela está...
em tudo; ela está em toda parte.
Eu gosto muito de pensar naquela imagem...
do peixinho, nadando num vasto mar...
e perguntando para um outro peixe...
"Onde é que fica esse oceano que todo mundo fica falando?"
Eu acho que a felicidade...
em princípio, sim, ela é reconhecida como uma coisa que...
que está dentro, né?
Mas acho que ela está em tudo também.
O nosso estado natural é um estado de felicidade.
No entanto, a gente... ou seja, a vida...
assim como nós a percebemos...
a realidade, assim como nós a percebemos...
cria uma série de fenômenos...
E esses fenômenos é que nos impressionam...
mais do que a felicidade.
Então, nós somos pessoas que se impressionam muito mais...
com os fenômenos que vão acontecendo à nossa volta...
do que exatamente de perceber que a felicidade...
nunca deixa de se oferecer a si mesma para nós.
Então, se a gente tirasse...
os véus dos fenômenos que nos circundam...
eu acho que a gente viveria num campo de felicidade.
Uma vez...
eu estava na casa de campo que a gente tem em Petrópolis...
e estava fazendo um exercício de relaxamento.
Eu gosto muito de lá. A gente tem...
uma piscina que é de água natural. A água entra de um lado e sai do outro...
nunca levou uma dose de cloro, de nenhum aditivo químico.
É quase um açudezinho, cavada na pedra...
com água puríssima que entra de um lado e sai do outro.
Eu gosto muito de ir para o gramado que tem em volta...
para fazer exercícios respiratórios, meditação.
E num desses exercícios respiratórios...
pranayama, como chamam os hindus...
eu tive a sensação de que estava dentro de mim, no fundo de mim...
nessa parte que era pura luz...
e que era absolutamente indiferente...
às circunstâncias do mundo ao meu redor.
Então, foi basicamente isso. Não foi uma...
não foi algo que eu fui buscar...
"Agora eu vou entrar em contato com o meu Eu Superior".
Eu fui fazer um exercício que eu faço...
quase todo dia, e principalmente quando estou lá em cima...
que o ar é ainda mais puro do que o ar aqui da cidade...
e fui surpreendido com essa...
com essa epifania, com esse insight...
momentâneo que ficou marcado pra sempre em mim.
Eu acho que um dos momentos felizes...
na minha vida, que eu me lembro bem...
foi um momento de transcendência metafísica, vamos dizer assim...
que é uma coisa que... "Puxa, cientista falando isso."
Mas é verdade. Quando eu tinha 15 anos...
o meu irmão mais velho me levou para a Ilha de Itacuruçá...
para passear lá, ele vivia lá sempre...
ele era meio riponga.
Ele me levou para lá, e falou: "Fica aí sentado nessa pedra."
Chamava Pedra da Baleia...
que é um pedrão, um granito enorme de uns 5 metros...
tinha uma escadinha para você subir.
"Fica aí, pensa no mundo, medita e depois a gente conversa."
E eu fiquei. Fiquei sentado naquela pedra...
e tinha uma acácia em cima de mim, cheia de flores...
e tinha aquele mar maravilhoso...
e eu vi um cardume de robalos pulando, sabe?
E naquele momento, eu percebi que eu não era mais eu...
eu era tudo aquilo...
e foi um momento muito...
muito espiritual para mim.
E eu senti...
me senti parte de uma coisa muito maior.
E talvez tenha sido aquele momento na minha vida...
em que eu tenha entendido que a minha busca...
era uma busca por entender esse mundo.
Eu me considero feliz...
e sou extremamente inquieto.
E curiosamente, quando eu entro na mata...
às vezes eu fico completamente...
em transe...
às vezes, eu fico completamente...
em silêncio...
Eu tenho muitos momentos de felicidade.
Obviamente que, se a gente fosse...
o tempo todo feliz, a gente nem saberia o que é felicidade.
E talvez nem valorizasse tanto esses momentos.
Eu tenho cinco netas...
e agora nasceu um neto.
Eu, com aquela criança de 7 meses nos braços...
tão sorridente...
aquilo me dá uma felicidade tão grande.
meu filho comentando essa felicidade...
disse que a felicidade era tão grande que ele tinha medo.
E eu disse: "Eu também sinto medo."
Porque quando a felicidade é demais...
a gente sempre tem medo de que alguma coisa possa acontecer.
Ainda que pareça paradoxal...
realmente o ser humano morre de medo da felicidade.
É como se uma iminência de tragédia chegasse perto de nós...
cada vez que nos sentimos muito felizes.
O medo da felicidade é um medo, evidentemente, de perder a felicidade...
mas parece que a chance de que isso aconteça aumenta muito...
justamente quando a gente está muito feliz.
Todas as tradições religiosas falam isto...
"Tem que atravessar a noite escura, o grande deserto."
Uma vez eu subi o Monte Fuji, que é um vulcão, né?
É uma coisa maravilhosa. Você começa a subir a montanha...
e ela é linda.
Então, tem flores, tem verdinho...
e aos pouquinhos vai acabando a vegetação...
e ela vai ficando cada vez mais íngreme e mais difícil.
A prática da vida espiritual é assim...
e muitas pessoas só querem o verdinho.
A beira da montanha ali embaixo é bonito, é gostosinho.
"Ah, eu já vi!"
Você sobe a primeira plataforma, você tem uma pequena visão...
de si, do mundo, da vida...
de um pontinho um pouco mais alto, e diz: "Já está bom".
Porque mais para lá, aí vai cansar.
Isso é suficiente? É, para muitas pessoas...
que bom, teve uma pequena visão.
Mas há outros que não se contentam com isto.
Eu quero ter a visão maior, então vou ter que fazer esse esforço maior.
Acredito mesmo que as grandes descobertas...
do homem para com ele mesmo não precisam...
não precisam de um...
de um grande telescópio, de um grande microscópio...
ou de uma caverna numa montanha...
pra ele se encontrar com ele mesmo.
Deve ser mais corriqueira essa procura.
Se a gente vivesse...
numa sociedade com uma educação em que isso fosse estimulado...
era mais fácil de todos nós conseguirmos isso.
Momento mágico!
Por fora e por dentro.
Muito bom.
Eu tomei três tiros no mesmo braço...
e isso lesionou ele, mas não foi...
neurologicamente...
foi muscular. Foi uma lesão muscular.
Agora...
eu tive um pulmão perfurado, e tive...
balas que...
afetaram a minha coluna.
Elas não chegaram a...
a machucar diretamente, mas...
só o calor e a vibração já lesionam.
Então eu fiquei...
a minha lesão foi T4...
uma lesão mais ou menos nessa altura aqui...
depois ela desceu, depois de um período de...
de choque medular, como eles chamam, a lesão desceu bastante.
Eu não ando e...
por não ter seccionado a medula direto...
eu também sinto muitas dores.
Durante uns bons sete anos da minha vida...
eu não tinha planos, eu ganhava um dia de cada vez.
Eu pensava em...
em ter...
em acordar e até a hora de dormir...
preservar um pouco de equilíbrio...
só por aquele dia.
Tem uma frase do Gandhi que diz que...
a nossa raiva contida é capaz de mover o mundo.
quando eu falo dessa raiva, é você pegar...
aqueles sentimentos que não são tão nobres seus...
e canalizar.
Usar aquilo...
fazer um moinho de vento com aquilo...
pegar aquela tempestade interna e gerar um outro tipo de energia.
Para mim, o grande catalisador não é a dor.
É a crise.
Porque a crise acrisola, a crise purifica.
A crise...
desfaz todas as gangas.
Tudo aquilo que não é substancial cai e fica só a substância.
E nisso, vai junto dor, vai junto decepção.
Então, a dor...
ela está a serviço...
ou ela está dentro de um complexo muito mais vasto.
A dúvida, a crise...
e mesmo uma depressão, até um certo ponto...
ela é bem-vinda por provocar uma reflexão, por assumir "Não sei."
"Tenho dúvida...
o que eu tenho aqui não me serve mais."
"Para onde eu vou? Não sei!"
Então, tenho que pesquisar, tenho que experimentar...
até... "Ah! OK. Agora é por aqui."
A vida é claros e escuros, né?
Quem, por exemplo...
tem pânico de trovão, sofre com a chuva.
Mas se cabe o trovão...
a chuva está tudo OK, né?
E se você está fora da cidade, no campo, a chuva é muito bem-vinda.
sempre vai depender.
A tristeza é uma emoção natural e importante...
porque ela nos ajuda a vivenciar o luto...
a deixar morrer.
Pra poder renascer. O problema é que todo mundo...
quer renascer, mas ninguém quer morrer.
Acho que todos os sentimentos estão aí pra você passar por eles.
Está triste, fica triste, chora.
"Cara, estou triste." "Está triste por quê?" "Estou triste por isso."
"Espera aí que eu vou chorar um pouquinho."
Chorou, passou?
"Vamos sair, vamos tomar um chope...
vamos ficar alegre?" "Vamos."
Eu acho que tem muita...
acho que tem muita glamorização...
desses lugares de emoção.
É tudo temporário.
Veja, as emoções em nós, elas são muito rápidas.
São instantâneas. São como...
O resto é memória.
E a gente fica chamando essa memória.
E nós adoramos chamar a memória, principalmente coisas desagradáveis.
É aquela história que eu gosto muito dos dois monges atravessando o rio...
e um deles ajuda uma jovem a atravessar...
e os monges faziam votos de não tocar em mulheres, né?
E um deles, uma hora depois, bravo...
"Você carregou aquela moça!"
"É, mas eu deixei ela lá.
E você continua carregando."
Às vezes nós temos problemas, dificuldades. Abra mão.
É difícil esse "abrir mão".
Mas isso é um dos ensinamentos principais.
Quando a gente abre as mãos, nela cabe todo o universo.
Quando nós seguramos alguma coisa, nós nos limitamos.
E às vezes nós seguramos...
a dor, o sofrimento.
"Eu sofro. Eu sofro mais do que você.
Você não entende a minha dor." Como não?
O sofrimento não alcança apenas...
os maus, os perversos...
O sofrimento alcança os bons.
Então, aproveite o sofrimento e veja a lição que ele vem trazer.
Isso que nós estamos fazendo agora é Yoga.
Procurando ter uma visão...
mais verdadeira, mais bela...
das coisas.
mas eu gostaria que você comentasse essa frase...
de que a vida é muito curta pra ser pequena.
Pois é, um dia, Benjamin Disraeli...
que foi um grande político e pensador do século XIX...
no mundo britânico, aliás foi Primeiro-Ministro da Rainha Vitória...
Benjamin Disraeli disse essa frase: "A vida é muito curta para ser pequena".
Já basta que a vida curta seja...
pra que a gente consiga apequená-la.
E o que é apequenar a vida?
É ter uma vida que seja superficial, banal, fútil...
uma vida que antes de tudo seja...
pequena, isto é, diminuta.
Vida é algo pra engrandecer a mim e aqueles que estão à minha volta.
Desse ponto de vista, eu sempre digo...
quando eu partir, e eu partirei...
eu sou mortal; nós somos o único animal que é mortal.
Todos os outros animais são imortais.
Porque embora todos morram, nós somos o único que além de morrer...
sabe que vai morrer.
Teu cachorro está dormindo sossegado nessa hora...
teu gato está tranquilo.
Você e eu sabemos que vamos morrer.
Desse ponto de vista...
não é a morte que me importa, porque ela é um fato.
O que importa é o que faço da minha vida...
enquanto a morte não acontece...
pra que essa vida não seja banal, superficial, fútil, pequena?
Nesta hora, preciso ser capaz de fazer falta.
No dia que eu me for, e eu me vou, quero fazer falta.
Fazer falta não significa ser famoso.
Significa ser importante.
Há uma diferença entre ser famoso e importante.
Muita gente não é famosa e é absolutamente importante.
Importar: quando alguém me leva pra dentro.
Importa. Ele me porta para dentro.
Ele me carrega. Eu quero ser importante.
Por isso, pra ser importante, eu preciso não ter uma vida...
que seja pequena.
E uma vida se torna pequena quando ela é uma vida...
que é apoiada só em si mesma... fechada em si.
Eu preciso trans-bordar.
Ir além da minha borda.
Preciso me comunicar.
Preciso me juntar. Preciso me repartir.
Nesta hora, minha vida, que, sem dúvida...
é curta, eu desejo que ela não seja pequena.
Acho que o sofrimento maior do ser humano...
se deve ao fato...
de que ele nasce sem manual de instruções.
Por não saber como ele mesmo funciona, ele sofre.
A causa do sofrimento, a causa do mal, é a ignorância.
Então, nada pode ser mais importante...
do que algo que nos liberte do sofrimento.
Sem o autoconhecimento como é que nós vamos nos libertar...
se nós causamos o nosso próprio sofrimento por ignorância?
Erasmo Silveira Neto é o meu nome verdadeiro...
que é o nome de nascença.
E é um menino... que ficou...
que está guardado dentro do meu coração.
Bem-criado.
Um menino que teve estudo.
Um menino que teve carinho da família inteira.
É um menino muito feliz.
Então, é por isso que a Greta tem bastante saudade disso.
A minha família reagiu com muita mágoa, com dor...
uns se sentiram traídos...
e eu, pra não machucá-los...
eu mesma abandonei a minha casa.
Fui morar na casa de amigos, em diferentes lugares.
Em lugares bons e lugares ruins eu estive.
Depois de algum tempo eu soube que a minha irmã me procurava...
a minha família me procurava, meu padrinho me procurava.
Depois de um certo momento...
eu achei que deveria enfrentá-los. Retornei...
e aí as coisas ficaram mais...
calmas.
Mas é engraçado que nunca nos sentamos...
para resolver isso.
Só voltei...
e minha mãe e meu pai me receberam...
e ficamos sentados os três no sofá...
sem trocar uma palavra.
Só perguntei se eu podia ficar.
Pronto. E fiquei.
Para mim, o autoconhecimento foi um processo libertador.
E, na verdade, ele até continua.
Eu não consigo, mesmo com os 55 anos que eu tenho hoje...
eu não consigo me situar de transexual...
de travesti ou de homossexual.
É uma pergunta que quando me fazem...
eu nunca sei responder.
A única coisa que sei dizer é que eu sou um ser humano...
e eu me sinto super normal...
na minha visão, e sei que não é normal na visão...
de outras pessoas, isso eu sei. Tenho conhecimento disso...
pelo preconceito, pelas coisas que a gente...
as barreiras e obstáculos que a gente encontrou no meio disso tudo.
Mas eu mesma não me classifico.
Desde que eu me conheço por gente...
a minha questão sempre foi...
desvendar os mistérios do universo.
Eu ainda era uma criança, com sete anos...
e eu perguntava: "Mãe, quem foi que fez o mundo?"
"Foi Deus." "Mas quem foi que fez Deus?"
"Não pensa nisso que você fica louco."
Isso aguçou minha curiosidade.
Eu entendi que esse era o objetivo da minha vida.
Eu sou apaixonado pelo não saber.
Pra mim, a dúvida é uma coisa muito legal.
"Você não acha que a gente precisa saber tudo?"
Não, a gente não precisa saber tudo.
Eu acho que a gente precisa saber.
E a gente precisa saber cada vez mais.
O que importa, na verdade, é o querer saber...
e não o responder tudo. Essa diferença pra mim é essencial.
A frase na entrada do Oráculo de Delfos...
era: "Homem, conhece-te a ti mesmo."
E todas as grandes tradições falam que...
o mais importante de tudo é você saber...
quem você é, você se conhecer cada vez melhor.
A gente fala isso: "Como posso fazer com que o maior número de seres...
entre no caminho, na verdade?"
E ao mesmo tempo...
quanto mais você quiser empurrar alguém pela porta...
mais essa pessoa se afasta.
Então, na verdade, a gente não pode fazer nada.
A gente acha que está fazendo, e isso é o falso eu, né?
Não há nada que você possa fazer. Você pode apenas apontar.
"Existe uma porta. Existe um caminho."
Mas cada pessoa tem que trilhá-lo.
As pessoas estão esperando por uma estação para serem felizes.
Quando eu crescer, quando eu me formar, quando eu me casar.
Quando eu tiver filhos, quando eu tiver dinheiro...
quando eu tiver um patrimônio, quando eu tiver saúde.
Então, as pessoas estão sempre transferindo...
a felicidade para uma próxima estação. E por isso, não são felizes.
Esse ditado eu acho muito acertado.
Não é uma estação; é uma maneira de viajar.
Eu acho que a gente tem que pensar no caminho.
Eu... comecei a pensar...
que era possível ser feliz na cadeira de rodas...
quando eu pensei não em chegar...
a ser feliz. Mas...
quando eu vi que ser feliz é justamente...
não abrir mão do caminho até lá...
do caminho até a felicidade.
Se vou chegar, não sei, mas...
eu finalmente tenho o meu caminho.
E esse meu caminho é melhor do que ficar parado.
A satisfação não está apenas em chegar no alto da montanha.
O aprendizado, o conhecimento você adquire justamente...
em olhar pros lados nessa escalada.
E você...
ter a percepção de que a escalada não é o topo da montanha, mas sim...
esse caminho até o alto da montanha.
O movimento da vida é o da eterna despedida, né?
É sair do útero...
pra caminhar com as próprias pernas, literalmente.
E eu lembro que a nossa filha, ela tinha uns dois anos de idade...
começando a andar...
e eu dei de presente pra ela uma mochilinha...
e o Luis falou...
"Uma mochila, Laís? Já?"
Que é o símbolo do...
dos mochileiros que vão por aí, né?
"Mas com dois anos é muito cedo uma mochila!"
Mas é isso; a vida é uma eterna mochila.
Pega a tua mochila, e vai!
A minha grande pergunta...
é "o que nos espera do outro lado?"
Quando eu fechar os olhos, o que vou ver?
Qual é o rosto de Deus?
finalmente...
quem é esse mistério?
Para mim, é a pergunta que me persegue...
dia e noite.
Qual é a minha essência? Quem sou eu?
Duvido que haja alguma maior...
porque todas as outras giram em torno dela.
Suponhamos que fosse "quem é Deus?", mas no fim...
quem sabe as duas são a mesma?
Quem sabe a essência do ser é Deus?
Comentários
Em toda a história da humanidade há
uma questão que nos acompanha...
em qualquer momento
da história humana.
A grande questão, que é
absolutamente abstrata...
mas ela é funda, é...
por que existe alguma
coisa e não nada?
Quatro grandes foram os caminhos
para tentar responder a essa angústia.
A ciência, a arte,
a filosofia e a religião.
Essas quatro áreas se dedicaram
a tentar explicar...
por que nós existimos,
por que as coisas existem...
com uma grande diferença:
a ciência...
procurou trabalhar o "como"
das coisas, isto é, o funcionamento...
enquanto a filosofia,
a arte e a religião...
foram em busca dos "porquês".
Ambos são necessários.
Não ao mesmo tempo,
e não do mesmo modo.
Mas tanto o "como" quanto
o "por que" são necessários.
Pergunta fundamental:
Deus existe, o que é, onde está?
O que estamos fazendo aqui?
Para que serve a vida? Quem sou eu?
Por que nascemos, morremos,
há significado nisto?
Pra que tudo isto?
É por nada?
Quem sou eu? O que sou eu?
Mais do que quem...
porque às vezes nós podemos dar
nossa carteirinha de identidade, né?
Tem meu nome, minha filiação...
mas não é essa a pergunta.
A pergunta é:
o que é você, ser humano?
Como funciona um ser humano?
Corpo, mente, espírito.
Há separação?
Há divisão?
Tem alguma coisa fluindo,
flutuando separada?
Ou será que não é uma integração,
uma integridade?
Eu estou muito interessado hoje em dia
na questão do conhecimento...
o quanto a gente pode conhecer
sobre o mundo.
Então, uma maneira
de você representar isso...
metaforicamente,
é você pensar que...
tudo que a gente
conhece está numa ilha.
E essa ilha é cercada
pelo desconhecido.
E à medida que o conhecimento
vai avançando...
a gente vai desenvolvendo novos
instrumentos, novas teorias...
essa ilha vai crescendo...
mas à medida que ela cresce...
cresce também a margem...
que ela faz, a fronteira,
vamos dizer assim...
que ela faz com o desconhecido.
Ou seja, quanto mais a gente
conhece sobre as coisas...
mais a gente desconhece também,
mais perguntas surgem.
E essa questão está ligada
profundamente com a questão...
de quanto a gente
pode conhecer do mundo.
Porque o ponto é que esse...
oceano do desconhecido,
vamos dizer assim...
em princípio, é infinito.
Ou seja, mesmo que o conhecimento
humano aumente com o tempo...
a gente nunca vai poder
conhecer tudo sobre o mundo.
Então a gente tem que viver
com essa sabedoria...
que a gente nunca vai poder
ter uma visão completa do mundo...
o que não nos torna
menos humanos.
Na verdade, nos torna
mais humanos, e menos deuses.
Um terapeuta...
que faça um bom trabalho...
com seu paciente...
inevitavelmente,
o paciente vai começar...
a querer ir além...
do fenômeno material.
À medida que ele se ajusta...
profissionalmente, afetivamente...
À medida que ele se alinha...
no social...
ele começa a questionar.
Quem sou eu?
O que estou fazendo aqui?
Para onde eu vou?
Será que de fato o meu
propósito externo...
está em sintonia com o
meu propósito interno?
Quem sou eu?
Essa é a grande pergunta.
E quando a gente vai
camada por camada...
sempre tem uma nova surpresa.
E mesmo que a gente
chegue na luz...
depois se pergunta
como a perdeu de novo.
Porque essa inspiração do ser...
ela pode escorregar
de novo entre os dedos.
Ninguém deve pensar
que já chegou lá.
E dizem que há um estágio
que é irreversível.
Eu, sinceramente,
não o alcancei.
E quando outro dia, numa
palestra vieram me dizer...
que eu isso e aquilo...
eu digo: "Olha, essa não é a opinião
que a minha esposa tem de mim."
"Quisera que ela tivesse toda a
admiração que a senhora está tendo."
Na minha vida, o meu esporte
serve como uma...
ferramenta de autoconhecimento
muito grande...
primeiro, porque...
pra ser profissional
e ter um bom rendimento...
você precisa se conhecer
fisicamente e mentalmente.
E segundo...
pela geografia do meu esporte.
Ele tem uma relação muito
direta com a natureza...
o que é saudável...
e também pela
necessidade de viajar.
O que faz com que você saia...
do seu casulo e comece
a entender o mundo...
e ver o mundo de formas diferentes.
A prática...
da onda gigante tem a ver
com a maneira que eu vejo a vida.
Eu gosto de desafios,
está entendendo?
Você se expõe de uma maneira
louca, você morre.
De uma maneira preparada,
você aprende.
Eu levei toda a minha vida
pra me entender.
E ainda vou passar o resto dela...
procurando mais e mais...
dicas pra que eu chegue...
em algum lugar que eu
ainda não estou hoje.
A busca nunca pára,
a busca é infinita.
É comum a todas as pessoas
buscar uma satisfação...
mas ao mesmo tempo
também é comum descobrir...
que nada me traz uma satisfação
de uma forma definitiva.
Nada realmente me preenche.
Então, tudo é insuficiente.
Existe uma busca...
do que é que vai dar
essa suficiência?
O que vai me produzir uma satisfação
de uma forma definitiva?
Essa também é uma busca comum...
mas é necessário discernir
esse problema...
discernir a situação,
analisar e descobrir...
do que estou sofrendo?
Eu estou sofrendo porque não tenho
determinadas coisas que as pessoas têm?
Ou mesmo que eu tivesse,
eu continuaria meu sofrimento?
Discernir o problema...
pra buscar a solução
é fundamental.
Nem sempre a gente discerne
o problema.
Mas busca uma solução.
E não sabe pra que está...
a solução pra quê?
Você não sabe o problema!
Então, a solução...
você não sabe nem exatamente onde
que você vai encontrar essa solução.
Se nós pensarmos
na criação do universo...
há 15 bilhões de anos atrás...
15 bilhões de anos
e um segundo atrás...
não existia nada de acordo com...
a teoria científica mais aceita
da criação do universo hoje em dia.
Há 15 bilhões de anos
surgiu o Big Bang.
Houve a grande explosão.
Então, se nós pensarmos
essa grande explosão...
como uma metáfora de
ondas concêntricas...
quando você joga uma pedra
num lago de águas tranquilas...
o que acontece?
Você forma ondas concêntricas.
Então, pensemos
nessa grande cadeia do ser...
como sendo essas
ondas concêntricas...
que é o próprio processo evolutivo
se desenvolvendo.
A primeira onda que se formou
é a onda da matéria.
A primeira coisa que surgiu
após o Big Bang foi matéria.
A matéria surgiu...
sob a forma de energia, matéria,
partículas subatômicas...
formando átomos, átomos,
moléculas, galáxias...
sóis, etc. e tal.
Posteriormente, há 5 bilhões
de anos atrás, surgiu a Terra.
A Terra, matéria ainda,
nessa primeira onda.
Há 3,5 bilhões de anos atrás...
surgiu a segunda onda,
a segunda macro-onda.
Surgiu a vida na Terra.
E essa vida, então...
partiu de todo um processo
de organismos unicelulares...
por uma cadeia filogenética
vegetal e animal...
até os animais superiores,
até os mamíferos superiores...
e aí, há cerca de 1 milhão
de anos atrás...
não é mais bilhão, é milhão...
apareceu a terceira onda...
que nós chamamos "a onda
da mente". Então, veja...
esse processo de expansão
de níveis de consciência...
vem se dando.
A ciência tradicional, atual,
pára aqui, ela não vai além.
Mas você há de convir comigo
que nós devemos...
esse processo...
ele deve continuar.
Então existe um quarto nível,
que seria o nível do espírito...
que seria o nível de transcendência
desse nosso nível atual...
desse macronível atual,
que é o nível do ego...
em que nos vemos como
uma individualidade.
Nós seremos... muito mais.
Nós seremos a nossa
individualidade e algo mais.
Então, esse é o conceito
do Grande Ninho do Ser.
É um conceito que existe desde as
tradições de sabedoria antigas...
e que hoje pode ser feita
uma releitura dele...
através desse processo de conhecimento
que a evolução nos trouxe.
Uma vez um aluno me pediu
uma entrevista...
chegou na minha casa
e me fez essa pergunta...
"Como é que o senhor se preparou?
Como é que planejou
a sua vida...
pra chegar onde chegou?"
Eu percebi logo
que ele me admirava...
queria seguir o meu
caminho, queria...
o mapa do caminho,
e eu disse a ele...
"Eu cheguei aonde cheguei...
porque tudo que
planejei deu errado."
É a pura verdade!
Então eu sou...
escritor por acidente.
Já fui outras coisas...
já fui professor de filosofia,
já fui teólogo, já fui pastor...
agora...
sou um velho.
O ser humano não é o corpo.
Ele possui o corpo, manobra
com o corpo, cuida do corpo...
mas ele não é o corpo.
Então, o Yoga...
é um estilo de vida sim,
você falou bem.
É um estilo de vida...
que cultiva o corpo, mas que
cultiva também a mente...
trabalha com as energias...
Os grandes iogues
não trabalharam o corpo.
Você viu alguma fotografia...
do grande iogue Jesus Cristo...
de cabeça para baixo?
Ninguém viu.
Ninguém viu os asanas...
da devota Santa Terezinha.
Ninguém viu.
São realidades.
Você não deixa
de praticar Yoga...
quando já não tem o corpo.
Envelhecido...
89 anos.
Eu continuo praticando Yoga...
mas sem trabalhar o corpo.
É muito pobre a
concepção do Yoga...
como ginástica física.
Tem um ditado superpessoal, né?
Isso já é muito íntimo, mas é
um ditado que fala assim...
está comigo há muito tempo, que é...
"Tudo um dia será nada.
E esse nada será o tudo...
que tanto procuramos encontrar."
Eu não sei de onde veio isso,
mas está na minha vida...
há muitas décadas.
Estou tentando entender
até hoje esse ditado.
Mas está comigo...
É uma coisa que veio.
A gente está falando tanto
de saúde, de autocuidado...
e isso é sair de um processo
de passividade...
de chegar pro médico e falar...
"Me dá os medicamentos.
Me dá as vitaminas.
Me indica qual é o
terapeuta maravilhoso...
que vai me tocar e vai
mudar a minha vida."
Para um processo mais
ligado a um autocuidado...
a um cuidado diário,
com o que você come...
com a maneira que você
respira, e se expressa.
Um olhar com muito mais
consciência sobre os teus atos.
Isso não é muito simples...
porque o paciente vem
ao médico pedindo...
o que é tradicional.
"Me tira desse lugar agora!
Eu quero uma mudança imediata."
E você devolve para
ele um caminho.
Uma visão de caminhar.
"Eu vou te ajudar nesse caminhar."
Mas não é uma...
uma mudança que vai acontecer
de maneira tão abrupta.
Eu acho que o sentido da vida é
a expressão da sua integralidade.
Quem sou eu?
Onde está minha expressão aqui?
E tentar viver isso...
seja lá do tamanho que for.
Eu acho que...
tem essa reflexão...
de chegar num momento
em que o ser...
é mais importante do que
o fazer apenas.
Que o fazer te ajuda
a sustentar o ser...
mas o ser é a base do processo.
Eu acho que isso é uma busca de
autotransformação, de autoconhecimento.
A gente aprende que
estamos aqui na Terra...
com uma finalidade específica...
que envolveria a nossa evolução.
Se alguém me perguntar...
"O que você está fazendo na Terra?"
A gente aprende que estamos
aqui para evoluir...
superando as nossas limitações...
as nossas dificuldades de
problemas, de relacionamento.
Enfim, crescer espiritual,
moral, intelectualmente.
Então, eu diria que a
finalidade da vida...
o objetivo da vida, o sentido
da vida pra mim seria isso.
O empenho de evoluir sempre.
Gente, eu sou muito tímida;
eu estou fazendo um esforço.
Não, eu quero comer minha barrinha.
Mas, vamos lá, pau na máquina!
Eu vou tomar água.
Vou pegar uma barrinha.
O pessoal do Big Brother anda
com esse negócio aqui grudado.
Como eles tomam
banho com isso?
O sentido da vida varia de acordo
com a época da vida.
O sentido da vida
pra mim já foi...
lutar por uma causa, depois
foi amar um homem...
depois foi...
cuidar das filhas.
Às vezes, tudo isso junto,
às vezes...
algo em primeira instância.
Mas, hoje em dia...
o sentido da vida é...
A vida já é,
ela já tem um sentido.
Eu não sei...
É diferente pra mim hoje.
Hoje eu acho que...
viver é o sentido.
Eu vi uma frase de um
pensador francês aqui...
entrevistado por algum veículo...
algum jornal brasileiro,
que dizia o seguinte...
"A vida não tem sentido nenhum...
mas não é proibido dar-lhe algum."
Então, esse eu acho que é
um pensamento muito...
ao mesmo tempo, libertário...
e ao mesmo tempo que dá
seriedade à ideia da vida.
A vida é um projeto individual...
e nisso talvez eu seja mais
anarquista do que...
um indivíduo vinculado a
qualquer outra doutrina...
é um projeto individual...
em que você tenta construir
uma história pra você.
E uma história...
que na minha cabeça
é norteada...
por valores da ordem moral...
eu sou muito zeloso desse aspecto...
vamos dizer assim,
da condição humana...
e acho que tem que ter...
alguma ideia também de
crescimento pessoal.
O sentido da vida é a gente sair daqui
80 anos depois da chegada...
um pouquinho melhor do que entrou.
Essa é o K2, a segunda maior
montanha do mundo, mas é...
a montanha mais difícil de todas,
a gente considera...
Só que aqui só está a parte
superior do K2.
Ele tem 8611 metros de altitude.
Esses são os 600 metros finais.
É gigantesca a montanha; ela
é muito mais imponente...
e muito mais difícil do que
o próprio Everest.
Em razão de muitas tragédias
que acontecem no K2...
o K2 é considerado
a "Montanha da Morte".
Em termos de número
de êxitos e mortes...
é a montanha em que há
o maior índice de fatalidades.
Então, é uma montanha muito
difícil, perigosa, muito arriscada.
Foram três tentativas e só na terceira
que eu consegui chegar lá em cima.
E eu prometi nunca
mais voltar ao K2.
É uma montanha muito bonita...
é uma montanha
que merece muito respeito.
Mas é uma montanha muito difícil.
E não foi possível.
Não foi falta de técnica...
não foi falta de condição nossa.
Realmente nesse ano as
condições do K2 estão extremas...
estão muito difíceis.
Nós conseguimos chegar...
até 8000 metros de altitude...
enfrentamos muita neve.
Infelizmente, tivemos que desistir
dessa escalada.
A montanha.
Eu precisei ir até a montanha
para poder me encontrar...
para poder me ver
diante de um espelho.
Você estar na montanha,
desempenhando...
um esforço físico intenso,
muitas vezes correndo riscos...
gera-se uma grande introspecção.
Você começa a pensar
em tudo na sua vida...
naquele momento em
que você está ali.
É incrível como a minha
cabeça viaja...
nesses momentos em que
estou na montanha.
E aí você começa a se conhecer...
começa a resolver problemas
dentro de você...
e ter forças pra encarar o mundo,
encarar pessoas, encarar situações.
Então, isso causa uma evolução.
Eu percebo que eu melhoro...
a partir do momento que vou para
a montanha, e volto para a cidade.
Já chegou gente aqui...
"Mas cadê os teus troféus?"
Eu não ganho um troféu...
uma medalha por ter chegado no
alto de uma montanha. Acho que...
uma das maiores recompensas
é aquela vista maravilhosa...
porque aquela vista me traz um
momento de contemplação.
É naquele momento
que eu me encontro.
Naquele momento que eu faço
minha comunhão com Deus.
Um dos desafios do ser humano...
é conhecer-se a si mesmo.
Já Santo Agostinho coloca como...
preocupação básica de
toda a atividade dele...
é responder:
"Quem sou eu, finalmente?"
O ser humano se faz
ele mesmo a pergunta.
E creio que é uma pergunta,
no fundo, irrespondível.
Porque o ser humano é
um projeto infinito.
Ele é um nó de relações voltado
em todas as direções.
Para dentro de si, para o outro...
para a natureza,
para o universo...
para o absolutamente
transcendente que é Deus.
E ele se realiza na medida em
que ele ativa essas relações.
Por isso, quanto mais ele...
ele se relaciona,
mais ele se enriquece...
e mais descobre possibilidades...
dentro dele.
Então, ele não é um
sistema fechado...
é um sistema aberto.
Daí que toda pergunta...
exige uma resposta.
E essa resposta levanta
uma nova pergunta.
E assim nós vamos de
perguntas em perguntas...
de respostas em respostas...
e no fundo nós não sabemos
quem somos.
Então, nós sempre
estamos buscando.
Encontramos espelhos de nós
mesmos em todas as partes...
e não nos identificamos
com nenhum deles.
Como os orientais expressam...
a prisão é Maia, a ilusão.
É eu não saber quem sou,
de onde venho, pra onde vou.
E como dizem os bons navegantes...
"Nenhum vento é favorável...
para aquele que não sabe
onde quer chegar."
E a liberdade...
é precisamente a pessoa
tomar consciência.
E ser capaz de...
de ser o autor da sua
própria existência.
Assumir a autoria da
própria existência.
Não é uma tarefa fácil...
mas creio que é a nossa tarefa.
E é isso que vai nos
trazer a felicidade.
E nesse momento,
eu me sinto feliz.
A minha matriz criativa...
o meu modelo de universo...
a minha compreensão
do mundo...
surgiu andando.
Andando, andando...
pelo agreste do cerrado...
pelas caatingas, pelas florestas.
Ali eu estabeleci o meu
percurso na Terra...
que é básico.
É espalhar belezas.
Fazer refletir.
Provocar.
Está aí.
O resumo do meu trabalho
basicamente é isso.
O revelador acontece
num momento...
muito fugaz.
Essa eu acho que é
a experimentação...
esse eu acho que é o encontro
com Deus, com a beleza.
É uma lembrança...
que não importa se tem registro.
Não importa a fotografia.
É algo absolutamente pessoal.
Tem que quebrar essa coisa de que
você fotografa para os outros.
Não, você fotografa pra si.
Depois, você espalha.
Entendeu?
É sempre difícil a gente falar
das qualidades da gente, né?
Principalmente porque...
geralmente quando
você fala de você...
aquilo não é exatamente você.
Aquilo é o que você quer que
as pessoas achem que é você.
E é uma armadilha.
Porque você...
descobre a qualidade
de uma pessoa...
não é quando ela fala de si.
É quando ela fala dos outros.
Não é?
Mas eu sei que você quer
algo mais objetivo, você...
pode estar pensando:
"Ela está fugindo...
da pergunta."
Mas...
acho que uma qualidade...
que a gente deve cultivar...
não é que eu a tenha...
mas que eu almejo tê-la...
é saber-me frágil.
Saber-me incompleta.
Saber-me faltosa.
Dependente...
desse outro que me sustenta,
que me completa...
que me acalma, e
que me inquieta.
Eu moro no sertão
de Pernambuco...
numa comunidade rural
que se chama Jatiúca...
que é um distrito de Santa
Cruz da Baixa Verde.
Na minha experiência foi isso, né?
As mulheres silenciadas...
pelos pais, pelos maridos,
pelos irmãos...
sem poder falar.
Eu tive que, com elas,
junto com elas...
recuperar a autoestima.
E o que é a importância
da autoestima...
na vida de uma pessoa,
na vida de uma mulher...
de uma mulher rural?
Para mim, quando eu
me quero bem...
quando eu me respeito...
quando eu sei que sou
um ser importante...
eu não permito que ninguém
me desrespeite...
que ninguém me bata, que
ninguém me desvalorize.
Pra chegar até as trabalhadoras...
nós temos vários exercícios.
E nos exercícios de corpo,
quando a gente perguntava...
"De quem é o seu corpo?"
Elas diziam sempre:
"É do meu marido, dos meus filhos."
O corpo nunca era delas.
Aí dava...
chance, oportunidade pra gente
começar a trabalhar...
"O meu corpo é meu.
Nem da igreja, nem do Estado,
nem dos homens.
Meu corpo é meu."
Bom, vamos se cumprimentar
novamente...
sabendo da importância
dos nossos corpos...
que é com eles que a gente vive, que a
gente anda, que a gente se cumprimenta.
A gente sempre muda de par.
Vamos se cumprimentar
com os pés!
Nossos pés lindos
e maravilhosos que nos conduzem!
Que nos levam pra roça,
que com eles nós caminhamos...
nossos lindos pés!
Eu estava numa reunião...
e tinha uma senhora.
Devia ter 60 anos ou mais.
E ela chorava, chorava, chorava.
Aí eu não quis expor...
e perguntar: "Por que você está
chorando?", no meio de todo mundo.
Procurei uma horinha
reservada, de lanche...
e aí perguntei a ela:
"Por que você está chorando?"
Ela disse: "Oh, Vanete...
é porque você está dizendo
tanta coisa linda...
tanta coisa importante...
e eu não vou mais conseguir
mudar minha vida.
É por isso que eu estou chorando.
Eu sempre vivi com um marido
que é machista...
que acha que só ele sabe.
Como é que vou mudar isso, depois
que eu tenho filhos e netos?"
Aí eu disse: "Não, não chore, não.
Você pode, sim."
"Mas posso o quê?"
"Você pode contar sua experiência.
Você pode dizer às outras...
às jovens, às suas netas...
que não é bom assim.
Que elas podem mudar
agora a vida delas.
Você quer uma
contribuição maior?"
Ela ficou com uma cara linda!
Quando alguém me pergunta:
"Você mudaria algo em você?"
Eu digo:
"Sempre, claro, com alegria."
Inclusive porque se há algo que me
chateia, é quando alguém diz...
depois de me encontrar,
depois de um ano...
"Cortella, você continua o mesmo."
Você já imaginou? Num
mundo de mudança...
de alteração, de processo,
eu ter ficado congelado?
Se tem uma coisa que eu detesto,
é a ideia de ter uma "vida formol"...
em que eu congelo alguns cadáveres.
Eu, pra usar uma frase antiga...
não me envergonho
dos homens que eu fui.
Mas gosto de lembrar que
eu já tive muitas vidas...
que foram sendo feitas,
refeitas e reinventadas.
Ao contrário do que muita
gente imagina...
a gente não nasce pronto
e vai se gastando.
A gente nasce não pronto
e vai se fazendo.
Eu não nasci pronto em 1954
e vim me gastando até hoje.
Eu nasci não pronto
e vim me fazendo.
O que nasce pronto é fogão,
sapato, geladeira.
Esse, sim, vai envelhecendo.
Então, eu quero, sim,
mudar várias coisas.
Quero mudar o meu
senso estético.
Quero ter uma ampliação da
minha capacidade de ouvir...
de enxergar, de fruir sabores.
Quero ser capaz de mudar
a minha conduta...
em relação a algumas pessoas
com as quais eu convivo...
pra que ela fique melhor.
Ainda bem!
Você ser do mesmo modo...
de uma maneira persistente,
não é sinal de coerência.
É sinal de tacanhice mental.
Eu trabalho com cinema, ou seja,
eu trabalho com a mentira...
e ao mesmo tempo,
com a pura verdade.
E quando eu tinha 18 anos...
eu participei do núcleo de
CPT do Antunes Filho...
o Centro de Pesquisa Teatral...
e eu lembro que lá,
tinha que...
cada um recitar...
uma pequena frase pra fazer
vários exercícios de teatro.
E uma frase que eu gostava
de recitar, um poeminha...
que é do Fernando Pessoa,
que é:
"O poeta é um fingidor. Ele
finge tão completamente...
que chega a fingir que é dor
a dor que deveras sente."
E...
isso o tempo inteiro, assim,
acho que porque eu trabalho...
com o reinventar o mundo...
mesmo num documentário você
também está reinventando...
você está colocando a sua visão...
escolhendo quais são os
trechos que vão ficar...
o que não vai ficar,
o que você esquece.
Então, isso é um tema que
o tempo inteiro volta.
Eu lembro que eu tive uma crise...
quando eu tava filmando
o "Chega de Saudade".
Na primeira semana,
e é normal...
na primeira semana, você ainda...
"Que filme é esse?"
Você está descobrindo a linguagem...
descobrindo os atores,
descobrindo a equipe...
a engrenagem ainda não
está funcionando.
E eu lembro de manhã cedinho, 5h30...
tendo que ir pro set de
filmagem, e eu no hall...
de casa, no elevador, eu empaquei.
Não conseguia sair...
e tive essa...
essa crise existencial que era...
"Por que eu escolhi uma profissão...
que eu fico reinventando a vida?"
"Quem sou eu pra dizer
o que é a vida?"
Uma profissão maluca...
e não vejo sentido nisso.
Acho que é mais importante eu
viver a vida, de verdade...
eu mesma viver as experiências...
do que eu ficar dizendo
como tem que ser.
E aí o Luis, meu marido
e roteirista...
quando ele percebeu que eu
ia engatar nisso, ele falou:
"Está bom, OK. Tem uma van
te esperando lá embaixo.
Depois a gente continua a conversa."
E ele cortou porque, naquele
momento realmente...
era um questionamento
profundo, mesmo...
do porquê tanto investimento
para reinventar a verdade.
Em toda obra de arte há
um elemento de dor.
A gente produz a beleza para
lutar contra a tragédia.
Aliás, essa é uma observação que
Nietzsche faz no livro dele...
As Origens da Tragédia Grega...
a Partir do Espírito da Música.
Os gregos...
tinham um agudo senso do trágico.
Eles não eram como os cristãos.
Os cristãos sempre têm um final feliz...
porque ainda que tudo
aconteça de desgraça...
você vai para o céu, e tudo vai
ser feliz. Os gregos, não!
Tragédia era tragédia.
Ele então faz a pergunta...
Se eles eram assim tão
dominados pelo...
espírito do trágico, por que
eles não se matavam?
A resposta que ele sugere...
é eles não se matavam...
porque eles cultivavam a beleza.
A beleza permitia...
que eles olhassem para a
tragédia face à face.
Eu sou autodidata.
Aprendi sozinha a pintar.
No meu caminhar, eu sempre
tenho em vista...
a evolução do meu espírito.
Eu, como espírito.
Não eu como a Tatiana hoje.
Sim, eu sou a Tatiana, também.
Então...
esse é meu caminhar. E
junto com a minha arte...
a minha arte me ajuda
muito com tudo isso...
porque...
é um autoconhecimento contínuo.
Estou o tempo todo lidando
comigo mesma...
com coisas de dentro, então...
isso ajuda muito.
Eu nunca passo impune
por um trabalho.
A gente vira um canal.
E recebe uma coisa que
é... da humanidade.
Que é da existência da vida.
Você vai receber...
a força de um vulcão muitas
vezes dentro de você.
Vai deixar que passe.
A experiência que eu tenho
quando eu trabalho é...
a minha preparação também...
é sempre de um esvaziamento
no começo...
abrir espaço...
e o quanto eu dou conta...
tecnicamente, é deixar que
isso venha e me utilize.
Em alguns trabalhos, eu sou
mais feliz nesse exercício.
Em alguns trabalhos, onde há
mais tempo, onde há...
sei lá, um ritual mais...
mais cuidadoso, você
consegue estar...
você se esvazia plenamente, a coisa
passa por você, e você...
realmente se surpreende o tempo
inteiro com o que está vindo.
E isso é muito... eu acho...
é onde o teu ego
não vai interferir.
E é muito legal,
sinceramente.
Por mais louca que seja a energia
que for passar por você.
É muito interessante.
É você abrir o teu inconsciente.
Aquilo que você experimenta no sonho,
você experimenta na vida.
Você experimenta na arte,
experimenta na atuação.
Essa liberdade, essa não repressão
que existe no sonho, sabe?
O palco te permite isso.
Coisas que às vezes no cotidiano...
você indo no mercado,
ou conversando com pessoas...
isso é mais difícil.
Tanto o processo do ator,
quanto o processo do palhaço...
são processos profundos
de autoconhecimento.
Se você quiser vê-los assim.
Você tem que visitar...
profundamente...
o teu amor se você
quiser fazer Romeu.
Se você não lida bem com
o amor, meu irmão...
você não vai fazer Romeu.
Você não vai conseguir
comunicar.
Você não consegue comunicar
o teu amor pra tua mulher!
O circo é um espetáculo que
desafia a lei da gravidade.
As pessoas voam,
se equilibram num fio...
jogam sete... objetos para o ar.
Fazem desaparecer e aparecer coisas.
Corpos perfeitos.
Por que o palhaço está ali?
O palhaço é aquele que cai!
O palhaço é aquele que erra.
O palhaço está no espetáculo de circo
para dizer: "Olha, tu é humano, tá?"
"Tem lei da gravidade, tá?"
O que faz o palhaço derrubar tudo?
O que faz ele bater a cabeça na parede?
O que faz ele cair no buraco?
Porque... ser quem você é...
então, eu sou aquilo lá.
E ser o que os outros
querem que eu seja.
Aí eu estou indo para lá...
porque eles querem...
aí eu derrubo o microfone.
Isso é o palhaço.
Isso é a técnica da palhaçaria.
Então, não, eu vou para lá
porque lá está meu sonho...
mas ali a coisa me chamou,
aí eu derrubo a moça...
eu derrubo o garçom.
O erro.
O erro é a nobre arte do palhaço.
A imperfeição.
A aceitação da sua inadequação.
Eu sou inadequado, e agora?
Vai deprimir...
por causa disso, ou vai rir?
É uma frase que eu li há algum
tempo, que diz que às vezes...
a gente está condenado a ser feliz.
Eu gosto bastante dessa frase...
acho que ela explica muita coisa.
Quando, por exemplo...
Eu não comecei a
tocar piano cedo.
E eu decidi que eu queria
tocar piano...
um pouco mais tarde...
com 18 anos...
que eu realmente queria ser pianista.
E...
quando eu percebi isso...
eu não tinha outra escolha
senão ser pianista.
E, nesse sentido, senti que era
quase uma condenação.
Porque pra mim ainda
era uma pergunta...
"Será que eu vou realmente tocar
piano? Saber tocar piano?"
E eu percebi que se não tocasse,
eu me sentiria muito triste.
Então, pouco a pouco eu fui
percebendo que era isso.
Quero dizer...
que às vezes a própria vida...
te apresenta o desafio...
e você não tem escolha se não
encarar aquele desafio.
Então é por isso.
Se a felicidade tivesse
um som, seria o silêncio.
Mas, também...
eu acho que a música de Bach...
trechos da Nona Sinfonia...
trechos de um Octeto de
Cordas do Mendelssohn...
trechos de manifestações populares...
de diferentes lugares do mundo.
Uma criança que nasce, né?
São várias coisas.
Felicidade para mim se
resume à paz de espírito.
Se você conseguir ter uma
paz interior, você é feliz.
Enquanto nós não temos
essa paz interior...
nós não somos felizes.
A felicidade é você se
sentir bem com você...
e com as pessoas que
estão ao seu redor.
Simplesmente é isso, pra mim.
E estar num lugar que você gosta.
Eu gosto de estar...
pra me sentir feliz, eu
tenho que estar...
no meio do mato, tenho que
estar no meio da natureza.
Muitas vezes, a felicidade...
ela é uma sensação de estar
no lugar certo, na hora certa.
Esteja acontecendo o que
está acontecendo.
Ela é mais isso.
É essa possibilidade de ser.
Sem tentar manipular a vida.
Sem tentar ir para ação...
ir para o fazer...
o tempo inteiro.
Estar livre de um desejo de
chegar a alguma coisa.
Então, relaxar essa busca...
básica de que falta alguma coisa.
E nem eu sei o que é...
ou então eu sei o que é,
mas não consigo chegar.
A minha felicidade depende também
da felicidade de muita gente.
Depende da felicidade
do meu marido...
da minha família,
dos meus amigos.
Eu acho que é muito difícil
você ser feliz sem...
comida, sem um abrigo...
doente, sem ajuda...
eu acho... bem difícil.
Eu acho que um mínimo
tem que ter.
diferentes de felicidade?
Porque a felicidade é
original pra cada um...
porque nós somos originais.
Nós somos únicos...
ainda que iguais.
E acho que a beleza...
da condição humana...
é essa possibilidade de você ser...
completamente original
e completamente igual.
É um paradoxo.
E é por isso que cada um
vai dar uma resposta...
diferente sobre felicidade.
A vida...
através da natureza, manifesta
o tempo todo felicidade.
Você vai perceber que as pessoas
sempre estão mais felizes...
quando buscam o sol...
a praia, as águas da cachoeira...
quando buscam se reunir em volta
de um fogo numa lua cheia.
Pulsa...
uma determinada energia,
uma determinada alegria.
A felicidade não exige dinheiro.
A felicidade não exige status...
para se manifestar.
A felicidade não exige oferendas.
A felicidade não exige
um curso de MBA.
E ela não exige
nenhuma formação.
Só sintonia.
Por isso, a minha resposta é óbvia.
Felicidade é um estado de espírito.
A felicidade eu acho
que ela está...
em tudo; ela está
em toda parte.
Eu gosto muito de pensar
naquela imagem...
do peixinho, nadando
num vasto mar...
e perguntando para
um outro peixe...
"Onde é que fica esse oceano que
todo mundo fica falando?"
Eu acho que a felicidade...
em princípio, sim, ela é reconhecida
como uma coisa que...
que está dentro, né?
Mas acho que ela está
em tudo também.
O nosso estado natural é
um estado de felicidade.
No entanto, a gente...
ou seja, a vida...
assim como nós a percebemos...
a realidade, assim como
nós a percebemos...
cria uma série de fenômenos...
E esses fenômenos é que
nos impressionam...
mais do que a felicidade.
Então, nós somos pessoas que
se impressionam muito mais...
com os fenômenos que vão
acontecendo à nossa volta...
do que exatamente de perceber
que a felicidade...
nunca deixa de se oferecer
a si mesma para nós.
Então, se a gente tirasse...
os véus dos fenômenos
que nos circundam...
eu acho que a gente viveria
num campo de felicidade.
Uma vez...
eu estava na casa de campo que
a gente tem em Petrópolis...
e estava fazendo um
exercício de relaxamento.
Eu gosto muito de lá. A gente tem...
uma piscina que é de água natural.
A água entra de um lado e sai do outro...
nunca levou uma dose de cloro,
de nenhum aditivo químico.
É quase um açudezinho,
cavada na pedra...
com água puríssima que entra
de um lado e sai do outro.
Eu gosto muito de ir para o
gramado que tem em volta...
para fazer exercícios
respiratórios, meditação.
E num desses exercícios
respiratórios...
pranayama,
como chamam os hindus...
eu tive a sensação de que estava
dentro de mim, no fundo de mim...
nessa parte que era pura luz...
e que era absolutamente
indiferente...
às circunstâncias do
mundo ao meu redor.
Então, foi basicamente isso.
Não foi uma...
não foi algo que eu fui buscar...
"Agora eu vou entrar em contato
com o meu Eu Superior".
Eu fui fazer um exercício
que eu faço...
quase todo dia, e principalmente
quando estou lá em cima...
que o ar é ainda mais puro do
que o ar aqui da cidade...
e fui surpreendido com essa...
com essa epifania, com
esse insight...
momentâneo que ficou
marcado pra sempre em mim.
Eu acho que um dos
momentos felizes...
na minha vida, que eu
me lembro bem...
foi um momento de transcendência
metafísica, vamos dizer assim...
que é uma coisa que...
"Puxa, cientista falando isso."
Mas é verdade. Quando
eu tinha 15 anos...
o meu irmão mais velho me levou
para a Ilha de Itacuruçá...
para passear lá,
ele vivia lá sempre...
ele era meio riponga.
Ele me levou para lá, e falou:
"Fica aí sentado nessa pedra."
Chamava Pedra da Baleia...
que é um pedrão, um granito
enorme de uns 5 metros...
tinha uma escadinha
para você subir.
"Fica aí, pensa no mundo, medita
e depois a gente conversa."
E eu fiquei.
Fiquei sentado naquela pedra...
e tinha uma acácia em cima
de mim, cheia de flores...
e tinha aquele mar maravilhoso...
e eu vi um cardume de
robalos pulando, sabe?
E naquele momento, eu percebi
que eu não era mais eu...
eu era tudo aquilo...
e foi um momento muito...
muito espiritual para mim.
E eu senti...
me senti parte de uma
coisa muito maior.
E talvez tenha sido aquele
momento na minha vida...
em que eu tenha entendido
que a minha busca...
era uma busca por entender
esse mundo.
Eu me considero feliz...
e sou extremamente inquieto.
E curiosamente, quando
eu entro na mata...
às vezes eu fico
completamente...
em transe...
às vezes, eu fico
completamente...
em silêncio...
Eu tenho muitos
momentos de felicidade.
Obviamente que,
se a gente fosse...
o tempo todo feliz, a gente nem
saberia o que é felicidade.
E talvez nem valorizasse
tanto esses momentos.
Eu tenho cinco netas...
e agora nasceu um neto.
Eu, com aquela criança
de 7 meses nos braços...
tão sorridente...
aquilo me dá uma felicidade
tão grande.
E...
meu filho comentando
essa felicidade...
disse que a felicidade era tão
grande que ele tinha medo.
E eu disse:
"Eu também sinto medo."
Porque quando a felicidade
é demais...
a gente sempre tem medo de que
alguma coisa possa acontecer.
Ainda que pareça paradoxal...
realmente o ser humano
morre de medo da felicidade.
É como se uma iminência de tragédia
chegasse perto de nós...
cada vez que nos sentimos
muito felizes.
O medo da felicidade é um medo,
evidentemente, de perder a felicidade...
mas parece que a chance de que
isso aconteça aumenta muito...
justamente quando
a gente está muito feliz.
Todas as tradições religiosas
falam isto...
"Tem que atravessar
a noite escura, o grande deserto."
Uma vez eu subi o Monte Fuji,
que é um vulcão, né?
É uma coisa maravilhosa. Você
começa a subir a montanha...
e ela é linda.
Então, tem flores, tem verdinho...
e aos pouquinhos vai acabando
a vegetação...
e ela vai ficando cada vez
mais íngreme e mais difícil.
A prática da vida espiritual é assim...
e muitas pessoas só
querem o verdinho.
A beira da montanha ali embaixo
é bonito, é gostosinho.
"Ah, eu já vi!"
Você sobe a primeira plataforma,
você tem uma pequena visão...
de si, do mundo, da vida...
de um pontinho um pouco mais
alto, e diz: "Já está bom".
Porque mais para lá, aí vai cansar.
Isso é suficiente? É, para
muitas pessoas...
que bom, teve uma pequena visão.
Mas há outros que não se
contentam com isto.
Eu quero ter a visão maior, então
vou ter que fazer esse esforço maior.
Esse final está legal.
Acredito mesmo que as
grandes descobertas...
do homem para com ele
mesmo não precisam...
não precisam de um...
de um grande telescópio,
de um grande microscópio...
ou de uma caverna
numa montanha...
pra ele se encontrar
com ele mesmo.
Deve ser mais corriqueira
essa procura.
Se a gente vivesse...
numa sociedade com uma educação
em que isso fosse estimulado...
era mais fácil de todos
nós conseguirmos isso.
Momento mágico!
Por fora e por dentro.
Por fora e por dentro.
Muito bom.
Eu tomei três tiros
no mesmo braço...
e isso lesionou ele,
mas não foi...
neurologicamente...
foi muscular. Foi uma
lesão muscular.
Agora...
eu tive um pulmão perfurado,
e tive...
balas que...
afetaram a minha coluna.
Elas não chegaram a...
a machucar diretamente, mas...
só o calor e a vibração
já lesionam.
Então eu fiquei...
a minha lesão foi T4...
uma lesão mais ou menos
nessa altura aqui...
depois ela desceu, depois
de um período de...
de choque medular, como eles
chamam, a lesão desceu bastante.
Eu não ando e...
por não ter seccionado
a medula direto...
eu também sinto muitas dores.
Durante uns bons sete
anos da minha vida...
eu não tinha planos, eu
ganhava um dia de cada vez.
Eu pensava em...
em ter...
em acordar e até a hora de dormir...
preservar um pouco de equilíbrio...
só por aquele dia.
Tem uma frase do Gandhi
que diz que...
a nossa raiva contida é
capaz de mover o mundo.
Eu acho que...
quando eu falo dessa raiva,
é você pegar...
aqueles sentimentos que não
são tão nobres seus...
e canalizar.
Usar aquilo...
fazer um moinho de vento
com aquilo...
pegar aquela tempestade interna
e gerar um outro tipo de energia.
Para mim, o grande catalisador
não é a dor.
É a crise.
Porque a crise acrisola,
a crise purifica.
A crise...
desfaz todas as gangas.
Tudo aquilo que não é substancial
cai e fica só a substância.
E nisso, vai junto dor,
vai junto decepção.
Então, a dor...
ela está a serviço...
ou ela está dentro de um
complexo muito mais vasto.
A dúvida, a crise...
e mesmo uma depressão,
até um certo ponto...
ela é bem-vinda por provocar uma
reflexão, por assumir "Não sei."
"Tenho dúvida...
o que eu tenho aqui
não me serve mais."
"Para onde eu vou? Não sei!"
Então, tenho que pesquisar,
tenho que experimentar...
até... "Ah! OK.
Agora é por aqui."
A vida é claros e escuros, né?
Quem, por exemplo...
tem pânico de trovão,
sofre com a chuva.
Mas se cabe o trovão...
a chuva está tudo OK, né?
E se você está fora da cidade, no campo,
a chuva é muito bem-vinda.
Então...
sempre vai depender.
A tristeza é uma emoção
natural e importante...
porque ela nos ajuda
a vivenciar o luto...
a deixar morrer.
Pra poder renascer.
O problema é que todo mundo...
quer renascer, mas ninguém
quer morrer.
Acho que todos os sentimentos
estão aí pra você passar por eles.
Está triste, fica triste, chora.
"Cara, estou triste." "Está triste
por quê?" "Estou triste por isso."
"Espera aí que eu vou chorar
um pouquinho."
Chorou, passou?
"Vamos sair, vamos
tomar um chope...
vamos ficar alegre?" "Vamos."
Eu acho que tem muita...
acho que tem muita glamorização...
desses lugares de emoção.
É tudo temporário.
Veja, as emoções em nós,
elas são muito rápidas.
São instantâneas. São como...
O resto é memória.
E a gente fica chamando
essa memória.
E nós adoramos chamar a memória,
principalmente coisas desagradáveis.
É aquela história que eu gosto muito
dos dois monges atravessando o rio...
e um deles ajuda uma
jovem a atravessar...
e os monges faziam votos de
não tocar em mulheres, né?
E um deles, uma hora depois,
bravo...
"Você carregou aquela moça!"
"É, mas eu deixei ela lá.
E você continua carregando."
Às vezes nós temos problemas,
dificuldades. Abra mão.
É difícil esse "abrir mão".
Mas isso é um dos
ensinamentos principais.
Quando a gente abre as mãos,
nela cabe todo o universo.
Quando nós seguramos alguma coisa,
nós nos limitamos.
E às vezes nós seguramos...
a dor, o sofrimento.
"Eu sofro. Eu sofro
mais do que você.
Você não entende a minha dor."
Como não?
O sofrimento não alcança apenas...
os maus, os perversos...
O sofrimento alcança os bons.
Então, aproveite o sofrimento e
veja a lição que ele vem trazer.
Isso que nós estamos
fazendo agora é Yoga.
Procurando ter uma visão...
mais verdadeira,
mais bela...
das coisas.
mas eu gostaria que você comentasse
essa frase...
de que a vida é muito curta
pra ser pequena.
Pois é, um dia, Benjamin Disraeli...
que foi um grande político e
pensador do século XIX...
no mundo britânico, aliás foi
Primeiro-Ministro da Rainha Vitória...
Benjamin Disraeli disse essa frase:
"A vida é muito curta para ser pequena".
Já basta que a vida curta seja...
pra que a gente
consiga apequená-la.
E o que é apequenar a vida?
É ter uma vida que seja
superficial, banal, fútil...
uma vida que antes de tudo seja...
pequena, isto é, diminuta.
Vida é algo pra engrandecer a mim
e aqueles que estão à minha volta.
Desse ponto de vista,
eu sempre digo...
quando eu partir, e eu partirei...
eu sou mortal; nós somos o
único animal que é mortal.
Todos os outros animais são imortais.
Porque embora todos morram, nós
somos o único que além de morrer...
sabe que vai morrer.
Teu cachorro está dormindo
sossegado nessa hora...
teu gato está tranquilo.
Você e eu sabemos
que vamos morrer.
Desse ponto de vista...
não é a morte que me importa,
porque ela é um fato.
O que importa é o que faço
da minha vida...
enquanto a morte não acontece...
pra que essa vida não seja banal,
superficial, fútil, pequena?
Nesta hora, preciso ser
capaz de fazer falta.
No dia que eu me for, e eu
me vou, quero fazer falta.
Fazer falta não significa ser famoso.
Significa ser importante.
Há uma diferença entre ser
famoso e importante.
Muita gente não é famosa e
é absolutamente importante.
Importar:
quando alguém me leva pra dentro.
Importa.
Ele me porta para dentro.
Ele me carrega.
Eu quero ser importante.
Por isso, pra ser importante,
eu preciso não ter uma vida...
que seja pequena.
E uma vida se torna pequena
quando ela é uma vida...
que é apoiada só em si mesma...
fechada em si.
Eu preciso trans-bordar.
Ir além da minha borda.
Preciso me comunicar.
Preciso me juntar.
Preciso me repartir.
Nesta hora, minha vida,
que, sem dúvida...
é curta, eu desejo que
ela não seja pequena.
Acho que o sofrimento
maior do ser humano...
se deve ao fato...
de que ele nasce sem
manual de instruções.
Por não saber como ele mesmo
funciona, ele sofre.
A causa do sofrimento, a
causa do mal, é a ignorância.
Então, nada pode ser
mais importante...
do que algo que nos
liberte do sofrimento.
Sem o autoconhecimento como é
que nós vamos nos libertar...
se nós causamos o nosso
próprio sofrimento por ignorância?
Erasmo Silveira Neto é o
meu nome verdadeiro...
que é o nome de nascença.
E é um menino... que ficou...
que está guardado
dentro do meu coração.
Bem-criado.
Um menino que teve estudo.
Um menino que teve carinho
da família inteira.
É um menino muito feliz.
Então, é por isso que a Greta
tem bastante saudade disso.
A minha família reagiu com
muita mágoa, com dor...
uns se sentiram traídos...
e eu, pra não machucá-los...
eu mesma abandonei a minha casa.
Fui morar na casa de amigos,
em diferentes lugares.
Em lugares bons e lugares
ruins eu estive.
Depois de algum tempo eu soube
que a minha irmã me procurava...
a minha família me procurava,
meu padrinho me procurava.
Depois de um certo momento...
eu achei que deveria enfrentá-los.
Retornei...
e aí as coisas ficaram mais...
calmas.
Mas é engraçado que nunca
nos sentamos...
para resolver isso.
Só voltei...
e minha mãe e meu pai me receberam...
e ficamos sentados
os três no sofá...
sem trocar uma palavra.
Só perguntei se eu podia ficar.
Pronto. E fiquei.
Para mim, o autoconhecimento
foi um processo libertador.
E, na verdade, ele até continua.
Eu não consigo, mesmo com os
55 anos que eu tenho hoje...
eu não consigo me situar
de transexual...
de travesti ou de homossexual.
É uma pergunta que
quando me fazem...
eu nunca sei responder.
A única coisa que sei dizer é
que eu sou um ser humano...
e eu me sinto super normal...
na minha visão, e sei que não é
normal na visão...
de outras pessoas, isso eu sei.
Tenho conhecimento disso...
pelo preconceito, pelas
coisas que a gente...
as barreiras e obstáculos que a gente
encontrou no meio disso tudo.
Mas eu mesma não me classifico.
Desde que eu me conheço
por gente...
a minha questão sempre foi...
desvendar os mistérios do universo.
Eu ainda era uma criança,
com sete anos...
e eu perguntava:
"Mãe, quem foi que fez o mundo?"
"Foi Deus."
"Mas quem foi que fez Deus?"
"Não pensa nisso que você fica louco."
Isso aguçou minha curiosidade.
Eu entendi que esse era
o objetivo da minha vida.
Eu sou apaixonado pelo não saber.
Pra mim, a dúvida é
uma coisa muito legal.
"Você não acha que a gente
precisa saber tudo?"
Não, a gente não precisa saber tudo.
Eu acho que a gente precisa saber.
E a gente precisa saber
cada vez mais.
O que importa, na verdade,
é o querer saber...
e não o responder tudo. Essa
diferença pra mim é essencial.
A frase na entrada do
Oráculo de Delfos...
era: "Homem, conhece-te
a ti mesmo."
E todas as grandes
tradições falam que...
o mais importante de tudo
é você saber...
quem você é, você se conhecer
cada vez melhor.
A gente fala isso: "Como posso fazer
com que o maior número de seres...
entre no caminho, na verdade?"
E ao mesmo tempo...
quanto mais você quiser empurrar
alguém pela porta...
mais essa pessoa se afasta.
Então, na verdade, a gente
não pode fazer nada.
A gente acha que está fazendo,
e isso é o falso eu, né?
Não há nada que você possa fazer.
Você pode apenas apontar.
"Existe uma porta.
Existe um caminho."
Mas cada pessoa tem que trilhá-lo.
As pessoas estão esperando por
uma estação para serem felizes.
Quando eu crescer, quando eu
me formar, quando eu me casar.
Quando eu tiver filhos,
quando eu tiver dinheiro...
quando eu tiver um patrimônio,
quando eu tiver saúde.
Então, as pessoas estão
sempre transferindo...
a felicidade para uma próxima estação.
E por isso, não são felizes.
Esse ditado eu acho
muito acertado.
Não é uma estação; é
uma maneira de viajar.
Eu acho que a gente tem
que pensar no caminho.
Eu... comecei a pensar...
que era possível ser feliz
na cadeira de rodas...
quando eu pensei não em chegar...
a ser feliz. Mas...
quando eu vi que ser feliz
é justamente...
não abrir mão do caminho até lá...
do caminho até a felicidade.
Se vou chegar,
não sei, mas...
eu finalmente tenho
o meu caminho.
E esse meu caminho é melhor
do que ficar parado.
A satisfação não está apenas em
chegar no alto da montanha.
O aprendizado, o conhecimento
você adquire justamente...
em olhar pros lados nessa escalada.
E você...
ter a percepção de que a escalada
não é o topo da montanha, mas sim...
esse caminho até o alto da montanha.
O movimento da vida é o
da eterna despedida, né?
É sair do útero...
pra caminhar com as próprias
pernas, literalmente.
E eu lembro que a nossa filha,
ela tinha uns dois anos de idade...
começando a andar...
e eu dei de presente pra
ela uma mochilinha...
e o Luis falou...
"Uma mochila, Laís? Já?"
Que é o símbolo do...
dos mochileiros que
vão por aí, né?
"Mas com dois anos é muito
cedo uma mochila!"
Mas é isso; a vida é
uma eterna mochila.
Pega a tua mochila, e vai!
A minha grande pergunta...
é "o que nos espera do outro lado?"
Quando eu fechar os olhos,
o que vou ver?
Qual é o rosto de Deus?
E...
finalmente...
quem é esse mistério?
Para mim, é a pergunta
que me persegue...
dia e noite.
Qual é a minha essência?
Quem sou eu?
Essa é a grande pergunta.
Duvido que haja alguma maior...
porque todas as outras
giram em torno dela.
Suponhamos que fosse "quem
é Deus?", mas no fim...
quem sabe as duas são a mesma?
Quem sabe a essência
do ser é Deus?
Quem sou eu?
Quem sou eu?